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sábado, 1 de outubro de 2016

Invalidade do Negócio Jurídico



INVALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO

        A expressão “invalidade” abrange a nulidade e a anulabilidade do negócio jurídico. (SILVA, 2008)

        Segundo Gonçalves (2012), é empregada para designar o negócio que não produz os efeitos desejados pelas partes, o qual será classificado pela forma mencionada (nulidade ou anulabilidade) de acordo com o grau de imperfeição verificado.


NEGÓCIO JURÍDICO INEXISTENTE

        O negócio é inexistente quando lhe falta algum elemento estrutural, como o consentimento (manifestação da vontade), por exemplo. (GONÇALVES, 2011)

        Assim se, não houve qualquer manifestação de vontade, o negócio não chegou a se formar; inexiste, portanto.

        A teoria do negócio jurídico inexistente é, hoje, admitida em nosso direito. Por se constituir em um nada no mundo jurídico, não reclama ação própria para combatê-lo, nem há necessidade de o legislador mencionar os requisitos de existência, visto que o seu conceito encontra-se na base do sistema dos fatos jurídicos. (GONÇALVES, 2012)

        Às vezes, no entanto, a aparência material do ato apresenta evidências que enganam, justificando-se a propositura da ação para discutir e declarar a sua inexistência.

        Para efeitos práticos, tal declaração terá as mesmas conseqüências da declaração de nulidade.


NEGÓCIO JURÍDICO NULO

        O negócio é nulo quando ofende preceitos de ordem pública, que interessam à sociedade.

        Assim, quando o interesse público é lesado, a sociedade o repele, fulminando-o de nulidade, evitando que venha a produzir os efeitos esperados pelo agente.

São as hipóteses legais de nulidade, considerando-se nulo o ato quando:

i)                   Praticado por pessoa absolutamente incapaz (art. 166, I - CC).

ii)                For ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto (art. 166, II - CC).

iii)              O motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito (art. 166, III - CC).

iv)              Não revestir a forma prescrita em lei (art. 166, IV - CC).

v)                For preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade (art. 166, V - CC).

vi)              Tiver por objetivo fraudar a lei imperativa (art. 166, VI - CC).

vii)           A lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção (art. 166, VII - CC)

viii)         For simulado, subsistindo o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma (art. 167 - CC).


        Algumas vezes, a lei expressamente declara nulo determinado negócio (ex.: arts. 489, 548, 549, 1428, 1475, 1548, etc.). Nesses casos, diz-se que a nulidade é expressa ou textual.

        Outras vezes a lei não declara expressamente a nulidade do ato, mas proíbe a sua prática ou submete a sua validade à observância de certos requisitos de interesse geral. Utiliza-se, então, de expressões como “não pode” (arts. 426 e 1521), “não se admite” (art. 380), “ficará sem efeito” (arts. 483 e 485), etc.

        Em tais hipóteses, dependendo da natureza da disposição violada, a nulidade será subentendida, sendo chamada de virtual ou implícita.


NEGÓCIO JURÍDICO ANULÁVEL

        O negócio é anulável (nulidade relativa) quando ofende interesse particular. Quando a ofensa atinge o interesse particular de pessoas que o legislador pretendeu proteger, sem estar em jogo interesses sociais, faculta-se a estas, se desejarem, promover a anulação do ato. (GONÇALVES, 2012)

        Trata-se de negócio anulável, que será considerado válido se o interessado se conformar com os seus efeitos e não o atacar, nos prazos legais, ou confirmar. A anulabilidade visa à proteção do consentimento ou refere-se à incapacidade do agente.

        Assim, o Código Civil declara que, além dos casos expressamente previstos em lei, é anulável o negócio jurídico por:

i)                   Incapacidade relativa do agente (art. 171, I - CC).

ii)                Vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores (art. 171, II - CC).


NULIDADE X ANULABILIDADE (NULIDADE RELATIVA)

Principais diferenças:

i)                   A anulabilidade é decretada no interesse privado da pessoa prejudicada. Nela não se vislumbra o interesse público mas a mera conveniência das partes. A nulidade é de ordem pública e decretada no interesse da própria coletividade.

ii)                A anulabilidade pode ser suprida pelo juiz, a requerimento das partes (art. 168, § único, a contrario sensu - CC), ou sanada, expressa ou tacitamente, pela confirmação (art. 172 - CC). Quando a anulabilidade do ato resultar da falta de autorização de terceiro, será validado se este a der posteriormente (art. 176 - CC). A nulidade não pode ser sanada pela confirmação nem suprida pelo juiz.

iii)              A anulabilidade não pode ser pronunciada de ofício. Depende de provocação dos interessados (art. 177 - cc) e não opera antes de julgada por sentença. O efeito de seu reconhecimento é, portanto, “ex nunc” (o negócio produz efeitos até o momento em que é anulado). A nulidade, ao contrário, deve ser pronunciada de ofício pelo juiz (art. 168, § único - CC) e seu efeito é “ex tunc”, pois retroage à data do negócio, para lhe negar efeitos. A manifestação judicial nesse caso é, então, de natureza meramente declaratória. Na anulabilidade a sentença é de natureza desconstitutiva, pois o negócio anulável vai produzindo efeitos até ser pronunciada a sua invalidade. A anulabilidade, assim, deve ser pleiteada em ação judicial. A nulidade quase sempre opera de pleno direito e deve ser pronunciada de ofício pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e a encontrar provada (art. 168, § único - CC). Somente se justifica a propositura de ação para esse fim quando houver controvérsia sobre os fatos constitutivos da nulidade (dúvida sobre a existência da própria nulidade). Se tal não ocorre, ou seja, se ela consta do instrumento, ou se há prova literal, o juiz a pronuncia de ofício.

iv)              A anulabilidade só pode ser alegada pelos interessados, isto é, pelos prejudicados (o relativamente incapaz e o que manifestou a vontade viciada), sendo que os seus efeitos aproveitam apenas aos que a alegaram, salvo o caso de solidariedade ou indivisibilidade (art. 177 - CC). A nulidade pode ser alegada por qualquer interessado, em nome próprio, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir, em nome da sociedade que representa (art. 168 - CC).

v)                Ocorre a decadência da anulabilidade em prazos mais ou menos curtos. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para pleitear-se a anulação, será este de 2 anos, a contar da data da conclusão do ato (art. 179 - CC). Negócio nulo não se valida com o decurso do tempo, nem é suscetível de confirmação (art. 169 - CC). Mas a alegação do direito pode esbarrar no usucapião consumado.


O ATO NULO NÃO PRODUZ NENHUM EFEITO?

        Deve-se ponderar a afirmação de que o ato nulo não produz nenhum efeito, pois ela não tem sentido absoluto e significa, na verdade, que o ato é destituído dos efeitos que normalmente lhe pertencem. Isto porque, algumas vezes, determinadas consequências emanam do ato nulo, como ocorre no casamento putativo*.
(se diz o casamento que mesmo nulo ou anulável, foi praticado com a crença de que foram atendidos todos as formalidades e regras de direito)*

        Outras vezes, a venda nula não acarreta a transferência do domínio mas vale como causa justificativa da posse de boa-fé.

        No direito processual, a citação nula por incompetência do juiz interrompe a prescrição e constitui o devedor em mora (art. 219 - CPC).


CONFIRMAÇÃO OU RATIFICAÇÃO

        O negócio anulável pode ser confirmado pelas partes, salvo direito de terceiro, sendo cabível somente nas hipóteses de anulabilidade.

        A confirmação pode ser expressa ou tácita e retroage à data do ato.

        A confirmação é expressa quando há uma declaração de vontade que contenha a substância do negócio celebrado, sendo necessário que a vontade de mantê-lo seja explícita (art. 173 - CC), devendo observar a mesma forma do ato praticado.

        O ato de confirmação deverá conter a substância da obrigação confinada e a vontade expressa de confirmá-la. Logo, preci­so será que se deixe patente a livre intentio de confirmar ato negocial que se sabe anulável, devendo-se, para tanto, conter, por extenso, o contrato primitivo que se pretende confinar, indicando-o de modo que não haja dúvida alguma. Não se poderá fazer uso de frases vagas ou imprecisas, pois a vontade de ratificar deverá constar de declarações explícitas e claras.

        Tácita é a obrigação já foi cumprida em parte pelo devedor, ciente do vício que a inquinava (art. 174 - CC), ou quando deixa consumar-se a decadência de seu direito.

         A vontade de confirmar está ínsita, pois, mesmo sabendo do vício, o confirmador não se importou com ele, e teve a intenção de confirmá-lo e de reparar a mácula.

        Expressa ou tácita, importa a extinção de todas as ações ou exceções de que dispusesse o devedor contra o negócio anulável (art. 175 - CC).

        Assim se, o ato for passí­vel de anulação, o lesado poderá lançar mão de uma ação, mas se houve confirmação expressa ou tácita, subentende-se que houve re­núncia a qualquer providência que possa obter a decretação judicial da nulidade relativa.

        A confirmação não poderá, entretanto, ser efetivada para prejudicar terceiro (art. 172 - CC). Seria a hipótese, por exemplo, da venda de imóvel feita por relativamente incapaz, sem estar assistido, e que o vendeu também a terceiro, assim que completou a maioridade. Nesse caso, não poderá confirmar a primeira alienação para não prejudicar os direitos do segundo adquirente.

        O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.

        Porém, se o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade, conforme preceitua o art. 170 - CC.

        Trata-se de hipótese em que o negócio jurídico nulo não pode prevalecer na forma querida pelas partes, mas seus elementos são suficientes para caracterizar outro.

        Analisa-se a pressuposição das partes. É a transformação de um negócio jurídico nulo em outro de natureza diversa. Não será fácil sua existência, na prática.

        Aproveita-se a finalidade do ato desejado pelas partes sempre que for possível e não for obstado pelo ordenamento. Trata-se da denominada conversão substancial do negócio jurídico, quando o negócio vale, em síntese, em sua substância, em seu conteúdo formal. Exemplo, uma escritura pública nula de compra e venda de imóvel poderia ser admitida como compromisso de compra e venda, para o qual não existe necessidade de escritura; uma nota promissória nula por não conter os requisitos formais pode ser convertida em uma confissão de dívida plenamente válida; etc. (SILVA, 2008)

         Para viabilidade da conversão há necessidade de requisitos que a doutrina aponta: identidade de substância e de forma entre os dois negócios (nulo e convertido), isto é, identidade de objeto num e noutro e adequação do negócio substitutivo à vontade hipotética das partes.

        Na conversão do negócio jurídico, vê-se um fenômeno posto à disposição das partes, no sentido de que seja aproveitada a manifestação de vontade que fizeram, desde que não seja contrariada sua intenção.


DISPOSIÇÕES ESPECIAIS

        Anulado o negócio jurídico por nulidade ou anulabilidade, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente – art. 182 – a parte final aplica-se às hipóteses em que a coisa não mais existe ou foi alienada a terceiro de boa-fé.

           Com a invalidação do ato negocial ter-se-á a restitui­ção das partes contratantes ao statu quo ante, ou seja, ao estado em que se encontravam antes da efetivação do negócio.

           O pronunciamento da nulidade absoluta ou relativa requer que as partes retomem ao estado anterior, como se o ato nunca tivesse ocorrido. Por exemplo, com a nuli­dade de uma escritura de compra e venda, o comprador devolve o imó­vel, e o vendedor, o preço.

        O Código Civil, no art. 181, abre uma exceção em favor dos incapazes, ao dispor que “ninguém pode reclamar o que, por uma obrigação anulada, pagou a um incapaz, se não provar que reverteu em proveito dele a importância paga”.

        O absoluta ou relativamente incapaz não terá o dever de restituir o que recebeu em razão do ato negocial contraído e declarado inválido, a não ser que o outro contratante prove que o pagamento feito reverteu em proveito do incapaz.

        A parte contrária, para obter a devolução do quantum pago ao menor, deverá demonstrar que o incapaz veio a se enriquecer com o paga­mento que lhe foi feito em virtude do ato negocial invalidado.

        Provado que o pagamento nulo reverteu em proveito do incapaz, determina-se a restituição, porque ninguém pode locupletar-se à custa alheia. Sem tal prova, mantém-se inalterada a situação. O ônus da prova incumbe a quem pagou.

        O menor, entre 16 e 18 anos, não pode, para eximir-se de uma obrigação, invocar a sua idade se dolosamente a ocultou quando inquirido pela outra parte, ou se, no ato de obrigar-se, espontaneamente declarou-se maior, perdendo, por isso, a proteção da lei.

        A invalidade do instrumento não induz a do negócio jurídico, sempre que este puder provar-se por outro meio (art. 183 – CC).

        A inoperância do instrumento não implicará a do ato, se este se puder provar por outros modos, o negócio continuará eficaz.  assim, por exemplo, a nulidade da escritura de mútuo de pequeno valor não invalida o contrato, porque pode ser ele provado por testemunhas.

        Mas será diferente se a escritura pública for da substância do ato, como no contrato de mútuo com garantia hipotecária. Assim se,  inválido for o instrumento que constituir uma hipoteca, in­válida será esta, uma vez que não poderá subsistir sem o referido instru­mento, nem por outra maneira ser provada.

        A invalidade parcial de um negócio jurídico não o prejudicará na parte válida, se esta for separável – art. 184 – trata-se da aplicação do princípio “utile per inutile non vitiatur”. Assim, invalidade da hipoteca também, por falta de outorga uxória*, impede a constituição do ônus real, mas é aproveitável como confissão de dívida.
(autorização ou consentimento da mulher aos atos jurídicos que o marido pratique, que não seriam válidos sem essa formalidade)*

        A invalidade da obrigação principal implica a das obrigações acessórias, mas a destas não induz a da obrigação principal – art. 184 – a regra consiste em aplicação do princípio “accessorium sequitur suum principale”.

        Assim, a nulidade da obrigação principal acarreta a nulidade da cláusula penal e a da dívida acarreta a da hipoteca. Mas a nulidade da obrigação acessória não importa a nulidade da obrigação principal.

        A nulidade da obrigação principal im­plicará a da acessória, p. ex., a nulidade de um contrato de locação acar­retará a da fiança, devido ao princípio de que o accessorium sequitur suum principale.

           A nulidade da obrigação acessória não atingirá a obrigação principal, que permanecerá válida e eficaz, por exemplo, se numa locação for anulada a fiança, o pacto locatício subsistirá.






Art. 46 da Lei 9.610/98:



Não constitui ofensa aos direitos autorais:

(...)

III - a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra”.














Referências bibliográficas:
Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 9. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011. 561p.
Gonçalves, Carlos Roberto. Direito das Obrigações. 9. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2012. 436p.
Gonçalves, Carlos Roberto. Contratos e Atos Unilaterais. 5. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2008. 497p.
Silva, De Plácido e. Dicionário Jurídico Conciso. 1. ed. Rio de janeiro: Editora Forense, 2008. 749p.
Pinto, Antônio Luiz de Toledo e outros. Vade Mecum. 11. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011. 2003p.


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